sexta-feira, 29 de março de 2013

A fundação de Salvador - Parte I



A ocupação do território da “cabeça do Brasil”.

Quando foi nomeado governador geral,Tomé de Sousa que, de acordo com o regimento de Almerim, documento que representa a certidão de nascimento de Salvador, continha instruções precisas para edificar uma fortaleza e povoação grande e forte num lugar conveniente, a intenção do rei de Portugal era dotar as novas terras de uma presença mais efetiva de representantes da coroa portuguesa. Portanto quando Tomé de Sousa desembarcou na região da Barra, atualmente nas imediações entre o Forte de São Diogo e o Iate Clube, já encontrou ali um núcleo de habitantes, uma pequena vila chamada de Vila Velha ou Vila do Pereira, assim chamada em virtude do nome do antigo donatário da capitania da Bahia Francisco Pereira Coutinho.


As origens da Vila.  
  
O Francisco Pereira era conhecido pela alcunha de “rusticão”, devido a sua rudeza no tratamento principalmente com os “gentios da terra”, ou seja, os índios. Quando aqui chegou em 1536 trouxe consigo parentes, amigos e colonos e “construiu casas para 100 moradores” e sua moradia estima-se que estava localizada no outeiro (alto)  nas imediações da Igreja da Vitória com vista de frente a enseada do Iate Clube. Aqui já habitava um velho morador da Bahia de Todos os Santos, Diogo Álvares, o Caramuru. Pouco se conhece sobre Diogo Álvares, contudo estudos indicam que entre 1510 e 1511 chegou a Bahia em virtude de um naufrágio. Caramuru foi importante peça nas negociações da tensa convivência entre portugueses e índios, tanto que obteve o lote de terra (sesmaria) que ia da região do atual bairro da Graça até o bairro do Rio Vermelho. Casou-se com Paraguaçu, a filha do cacique, que mais tarde foi batizada na França com o nome de Catharina Paraguaçu. Converteu-se ao catolicismo e ergueu uma pequena ermida que mais tarde transformou-se na Igreja da Graça (no bairro da Graça) , local onde esta sepultada. Apesar da interferência de Caramuru para apaziguar os ânimos entre colonos e índios um fato vai mudar drasticamente a vida da capitania da Bahia. Em 1545 algumas tribos dos índios da Bahia de Todos os Santos atacaram a vila do Pereira e ao mesmo tempo os colonos rebelam-se contra o donatário e desejavam prendê-lo. Mas ele retira-se para a capitania de Pero de Tourinho em busca de ajuda, onde permaneceria até em 1546 quando Caramuru foi buscá-lo trazendo a notícia de que os franceses haviam incendiado a vila do Pereira e confiscaram a artilharia de defesa. Pereira Coutinho resolveu regressar, mas quando estava nas imediações da Ilha de Itaparica sua embarcação afundou nos recifes e os Tupinambás de Itaparica que eram antropófagos o prendem e o devoram em seguida. Com a morte do donatário o rei D. João III prefere reverter a capitania para a Coroa e foi esta circunstância que fez da Bahia a primeira capitania da Coroa e propiciou a condição de sede do governo-geral do Brasil criado em 1548.


Gravura indicando os limites da Vila do Pereira, local onde situava-se a moradia no donatário Francisco Pereira Coutinho, o rusticão. Atualmente corresponde a área do Farol da Barra ao Forte de São Diogo.










A chegada de Tomé de Souza.

Quando desembarcou no Porto da Barra em 29 de março de 1549, Tomé de Souza foi bem recebido pelos colonos, índios e por Diogo Caramuru. O então governador geral do Brasil trazia consigo um documento com instruções claras sobre a sua empreitada. O Regimento de Almerim, podemos dizer que foi a certidão de nascimento  de Salvador, determinava, no seu primeiro item, o que vem demonstrar a importância da questão, que o primeiro governador fizesse "uma fortaleza e povoação grande e forte" em um lugar conveniente destinada a ser a Cabeça do Brasil para dali "dar favor e ajuda às outras povoações". Este seria o primeiro espaço físico e urbano de total controle do Estado, chefiado por um funcionário e administrador do Estado português na colônia.
Espaço metropolitano que deveria dar "favor e ajuda às outras povoações e se ministrar justiça e prover nas coisas que competirem a meu serviço e aos negócios de minha fazenda e a bem das partes".
Sem perder tempo, partiram em busca do local adequado para construção da sede administrativa. Tomando o caminho em direção ao atual corredor da Vitória, e margeando o litoral chegaram ao local que se achou mais adequado para iniciar a fortificação, nenhum ponto é mais apropriado para o assentamento da cidade, que o trecho no alto promontório entre as gargantas da Barroquinha e do Taboão,acidentes topográficos propícios para construção de obras de defesa, compreendido entre a atual Praça Castro Alves e a Misericórdia. Erguida no alto de uma escarpa, entre a Baía de Todos os Santos e os morros, Salvador foi a primeira cidade planejada do Brasil. O mestre das obras Luiz Dias foi o “arquiteto” que traçou as linhas limítrofes e o plano urbano primitivo (obedecendo as “traças e amostras” recebidas em Lisboa) do “arruamento” daquela que foi denominada cidade do Salvador. Os colonizadores tomaram o cuidado de construí-la nos moldes das cidades de sua terra natal e mantiveram nela a aparência medieval de Lisboa, com ruas estreitas, curvas e dispostas perpendicularmente umas às outras. Outra herança lisboeta são seus fortes, que fazem de Salvador uma típica cidade-fortaleza. Abrigando cerca de 1000 habitantes em 1549, a primeira capital do Brasil cresceu em dois planos, a cidade alta e a cidade baixa. O movimentado porto e um pequeno comércio local ocupavam a estreita e extensa faixa litorânea (era o que mais tarde denominou-se bairro da Praia, atual Bairro do Comércio) ligada à cidade alta por ladeiras e barrancos (em 1920 foi construído o Elevador Lacerda). Os edifícios oficiais (a casa do governador-geral e a sede do governo foram os primeiros a serem erguidos) e as residências localizavam-se no alto da escarpa, a parte nobre da cidade. Mas foi na cidade baixa, nas imediações onde hoje situa-se o elevador Lacerda e a Igreja da Conceição da Praia, que era conhecida como Ribeira do Goes ou das Naus, que foram construídos os depósitos e barracões para o armazenamento do  material de construção utilizado para erguer a cidade. Neste mesmo local, na praia, que foi erguida a primeira ermida, consagrada a Nossa Senhora da Conceição, padroeira do governador.

Núcleo urbano primitivo da cidade do Salvador - 1551

As ligações entre as partes alta e baixa da cidade, fundamentais para os trabalhos de construção e, de comunicação de pessoas e coisas, foram, no princípio duas, a saber: Primeira- o caminho que veio a ser conhecido como Ladeira da Conceição, que tinha inicio no alto, na praça do Palácio, atualmente Praça Municipal, estando a construção terminada no final de 1549. No entanto este caminho por ser considerado de alta declividade mostrou-se inconveniente para o transporte do material de construção, motivo pelo qual levou a imediata construção do Segundo, que partindo da Porta de Santa Luzia – atual praça Castro Alves – seguia pelas imediações das Ladeira da Gameleira e da Preguiça e terminava na Ribeira dos Pescadores – defronte as Fonte da Pedreiras, atualmente nas imediações do Trapiche Adelaide. 


Modificações no território de Salvador. Uma cidade fortaleza ou a fortaleza que tornou-se cidade? 
                                                                                 

Poucos registros restaram dos muros da fortificação erguida por Luis Dias em 1549, tanto que em 1580 já não se podia ver os muros da antiga fortificação. O projeto de defesa de Salvador constituía em conjunto de muros e fossos, articulado por caminhos irregulares, praça administrativa, espaço para igreja e dois alargamentos encerrados na porta Sul - Porta de Santa Luzia – (era o fosso situado entre o atual Palácio dos Esportes e a escada da Barroquinha) e na porta Norte ( Porta de Santa Catarina), assim a cidade no primeiro período se apresenta como espaço que abriga as edificações vinculadas às decisões máximas da província, mas também como abrigo de atividades sociais, como articuladora entre edifícios religiosos e lugar onde aconteciam atividades comerciais que exploram os caminhos de conexão geral 
(REIS,FILHO, 1968; UFBA, FAUFBA-CEAB, 1998, p.144-145). A cidade fortificada protegia-se externamente de outras potências da Europa pelos fortes localizados na entrada da Baía de Todos os Santos: Santo Antônio da Barra (1583) e Mont Serrat (1583/87). Estas construções constituiriam uma nova paisagem no “sítio natural” que, até então, somente sofria intervenções provenientes de tentativas de domínio e explorações incipientes e externas, ou das culturas pré-existentes (UFBA, FAUFBA-CEAB, 1998, p.66; OLIVEIRA, 2004, p.182 187). A arquitetura militar define a paisagem de Salvador desde os seus fortes, suas portas de defesa, seus baluartes, suas muralhas e quartéis, entre outros tipos. Posicionados estrategicamente, os seus largos para treino, organização e manobra das tropas e equipamentos de artilharia, em muito contribuíram para a definição do tecido urbano, como se verá mais à frente.


Um comentário:

  1. Bem bacana esse artigo, para compreender a história Brasileira. "A primeira cidade planejada do Brasil".

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